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Os papéis das mulheres nas aldeias indígenas do Rio Envira.

A Comissão de Mulheres Indígenas da Rio Envira – COMIRE é formada por representantes mulheres e de jovens de 39 aldeias na região de Feijó/Acre. São elas que incentivam  trabalho coletivo e a boa educação na aldeia e são escolhidas pela comunidade pelo seus dom e talento nas atividades que realiza.

 

Siriani Kawinawa é a atual líder da Comissão de Mulheres Indígenas da Região do Envira – COMIRE e explica que os objetivos da comissão são de participar de eventos e reuniões regionais, governamentais ou não, representando a coletividade feminina exigindo seus direitos e necessidade além do compartilhamento destas informações com a comunidade das mulheres caciques, artesãs, parteira e pajé. Siriani explica que a habilidade do artesanato é passada de geração por geração tornando as mulheres artesãs nas quatro etnias indígenas. A cacique mulher representa a aldeia em reuniões externas e entre aldeias e é escolhida em uma reunião da comunidade. Normalmente o cacique representa uma família com o posto ocupado de pai ou mãe para filho ou filha e o escolhido deve possuir a capacidade de diálogo. A parteira normalmente faz todos os partos da aldeia e esta habilidade é identificada pela mãe nas filhas. A formação de parteira não é certificada, contudo é muito importante ser valorizada e reconhecida pela sociedade a parteira indígena. Já a formação do pajé é feita com o acompanhamento do aprendiz das atividades do pajé. Atualmente jovens estão se formando pajé incorporando o conhecimento das plantas, dos chás, das dietas tendo a necessidade de cumprir uma série de etapas e dietas sendo a formação continua do aprendizado. A troca de conhecimento entre os pajés é uma atividade constante no mundo indígena.

 

 

O povo Shanenawá localizado na região do rio Envira

A Aldeia Paredão, formada pelo povo Shanenawá, está localizada na região do rio Envira, próximo a cidade Feijó no Estado do Acre. Anualmente a aldeia realiza, na última semana de julho, festival cultural em agradecimento a colheita dos vegetais cultivados pelas diversas aldeias situadas nesta região amazônica. “Nós falamos como foi a produção do ano passado e oferecemos rezas aos deuses pedindo uma boa produção para o próximo ano”, explica o Shanenawá.

As 15 aldeias da região, de etnias variadas, são convidadas para a troca de experiência. No festival dos legumes, cada povo leva o que produz e ocorre o intercâmbio de métodos utilizados. O festival é aberto a visitantes de fora do Acre. Também haverá aplicação das medicinas da floresta e acampamento, em outras atividades para quem se interessar!

Veja o convite de Maná no vídeo!

Caso desejem participar o evento participando do grupo organizado pelo Povo da Floresta basta encaminhar e-mail para contato@povodafloresta.com.br

Os povos indígenas são os primeiros habitantes conhecidos da Amazônia

Os povos indígenas são os primeiros habitantes conhecidos da Amazônia. Eles detêm o conhecimento ancestral da floresta e toda uma tecnologia de interatividade com o meio ambiente sem destruí-lo. Vivem hoje na Floresta Amazônica, mais de 210 mil índios, 405 áreas que representam 20,5% do território amazônico e 98,5% de todas as terras indígenas do Brasil.

Conheça as atividades desenvolvidas em conjunto com hunikuins e shanenawás que vivem no Acre e a proposta de cocriação dessa grande aventura que é experimentar um pouco do cotidiano de sabedoria ancestral! Por meio dela você pode experimentar um profundo mergulho no coração da Amazônia, um novo caminho para o autoconhecimento e a descoberta das medicinas da floresta.

Para saber mais sobre essa programação e as expedições do Povo da Floresta entre no site ou nos contate por e-mail contato@povodafloresta.com.br sobre itinerários, passeios, preços e datas de viagens

Haux! Haux!

Equipamentos que dão conforto e podem salvar sua pele numa viagem à floresta Amazônica

Rede, a melhor pedida para dormir na floresta

A aventura amazônica pode exigir muito do corpo de quem não está acostumada ou acostumado a doses grandes de umidade, calor, insetos e animais que vivem em harmonia na maior floresta do mundo – com seis milhões e setecentos mil quilômetros quadrados de área dividia entre Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru e Venezuela (mais de 60% no território brasileiro). Para prevenir desconfortos e proporcionar uma expedição sem contraindicação, o projeto Povo da Floresta investe em itens de primeira necessidade – que cada expedicionário e expedicionária terá quando se juntar à equipe de apoio. São eles:

Botas de cano alto – que protegem as pernas de cortes e ataques de pequenos insetos

 

Mosquiteiros – que propiciarão tranquilidade contra insetos e morcegos na hora do descanso

 

Rede de dormir – integradas aos mosquiteiros e elevadas, para segurança contra insetos rasteiros

 

Kit medicina da floresta – com potes de medicina da floresta contra picadas de insetos, para proteção e repelir insetos, loções de alívio

Importante – esses itens não precisam ser comprados, nem trazidos, ficando a cargo do projeto Povo da Floresta

Além desse diferencial oferecido aos expedicionários, sugerimos que a preparação de bagagem seja feita com antecedência e de forma consciente. Além do que oferecemos, a Expedição Povo da Floresta recomenda fortemente que cada expedicionária e expedicionário leve para a viagem:

Bloqueador solar, chapéu, leque, meias que absorvem o suor dos pés, para atividades em regiões de calor, kit com os medicamentos que a pessoa está habituada a usar (para dores musculares, analgésico, cólicas, dor de cabeça, enjoo e curativos etc), roupas compridas – sim, você vai passar calor, mas as roupas protegem contra os mosquitos, que aliás, segundo estudos, preferem as roupas escuras, logo, prefira as claras.

Roupas leves e compridas protegem de picadas

O clima amazônico é tipicamente tropical, com temperatura média na floresta é de 27,9 °C durante a estação da seca e em 25,8°C durante a estação das chuvas, segundo dados da WWF. A umidade relativa do ar é muito elevada e atinge em média 88% na estação das chuvas e 77% na estação da seca. Na floresta chove e faz calor quase todos os dias do ano. Organize sua bagagem de forma estratégica e venha com a gente! A aventura é por nossa conta e dos povos originários da floresta!

O rapé, sua dieta e o autoconhecimento

Conheça o rapé: o ancestral pó amazônico e suas indicações

Relato de Pedro Benatti Alvim, do Povo da Floresta.

Entre os povos indígenas da Amazônia é costume fazer alterações na alimentação quando determinadas pessoas são iniciadas espiritualmente em determinados estudos. As chamadas dietas são restrições alimentares que variam de acordo com o propósito. Por exemplo, a dieta de um caçador que irá acampar durante vários dias na mata para trazer carne para a comunidade é diferente da dieta de um pajé que se aprofunda no estudo da ayahuasca ou do rapé.

Folhas de tabaco secando ao sol pra fazer rapé

Muitas pessoas ficam curiosas e visitam esses povos para ampliar o estudo da pajelança e curandeirismo amazônicos. Os shawãdawas, hunikuin, katukina, yawanawa e outros do Acre normalmente introduzem a dieta do rapé para não índios interessados no tema. Essa dieta é vista como um primeiro passo para se conhecer com mais respeito as medicinas da floresta.

Durante 21 dias, a pessoa iniciada elimina de sua rotina o sal, o açúcar, todos os tipos de carne e atividade sexual. Frutas e derivados de animais são permitidos, e é um preceito que pode variar entre cada etnia. A comida preparada para as pessoas que estão nessa dieta são preparadas especialmente para elas, e não podem ser divididas com outros que estão se alimentando normalmente para que o propósito da energia se preserve.

O rapé, medicina feita a partir de tabaco moído e cinza de árvores, deve ser auto-aplicado durante os dias. Não se restringem o número de aplicações, mas se sugere uma disciplina de pelo menos dois ou três sopros por dia: uma ao acordar, em jejum; uma ao anoitecer e um antes de dormir. A primeira e a última aplicação do dia são fundamentais nesse estudo. Por ser um estudo pessoal que irá familiarizar a energia do estudante com a medicina da floresta, a pessoa não pode receber sopro de outras pessoas durante a dieta.

A ideia de se eliminar certas atividades e alimentos durante o período é de purificar o corpo e limpar o canal espiritual. Esse jejum voluntário retira certos vícios alimentares comuns e coloca a pessoa em estado mais intenso de auto-observação. Assim ela terá mais clareza dos ensinamentos da floresta ao consagrar o rapé e outras medicinas.

Os pajés mais velhos também conhecem outras dietas para afastar doenças e conhecer outras medicinas. No entanto, são estudos mais profundos que devem ser passados pessoalmente àqueles que estão trilhando o caminho, preservando a tradição e os mistérios da floresta.

Sopro do rapé feito em ritual shanenawá. Imagem meramente ilustrativa

Vida e alimentação numa comunidade ribeirinha da Amazônia

Relato de Pedro Benatti Alvim, do Povo da Floresta.

Há tempos eu tinha o sonho de visitar o Acre e conhecer seus povos indígenas. Transformado por uma jornada espiritual interna na cidade, senti que precisava externalizar essa viagem, indo às raízes daquele conhecimento que tanto estudava. Em São Paulo, fui surpreendido por um convite de Ana e Anazildo (Nazinho) Siqueira Shawãdawa para visitar sua casa no Croa. Sinto que vivi os frutos do que gerações de índios, africanos, sertanejos e tantos povos ancestrais são capazes de oferecer de maneira tão única nos rios dessa terra brasileira. Conto aqui um pouco sobre a vida e alimentação de uma comunidade ribeirinha da Amazônia brasileira

O Croa é um igarapé ligado ao rio Juruá a mais ou menos 35 quilômetros da cidade de Cruzeiro do Sul. A comunidade ribeirinha que vive em suas ricas margens estabeleceu-se lá há cerca de 30 anos. Atraídos primeiramente pela extração de látex na região amazônica, hoje os ex-seringueiros, seus filhos, filhas, primos, netos etc. sustentam-se de forma criativa e variada dos recursos que a natureza oferece. Pesca, extração de frutíferas, carpintaria, artesanato e, sobretudo, o turismo comunitário são algumas das atividades que seus moradores empreendem ali mesmo, prezando e preservando a riqueza local. O compadrio e a camaradagem são cotidianos no rio Croa, que fecha em paz seus laços de aliança e se abre para receber pessoas de todo o mundo.

Como é a vida e a alimentação em um lugarejo na Amazônia brasileira

Cheguei em Cruzeiro do Sul às 23h30 do dia 29/12/2017 e logo no desembarque encontrei Nazinho e o taxista que ele chamou para nos levar até a ponte da BR-364 sobre o rio Crôa. No caminho passamos na casa da mãe de Ana dentro da cidade e seguimos pela estrada. Na ocasião não conheci Dona Vera, mas ao passar das semanas compreendi que ela tem uma localização estratégica fundamental na família. Por morar na cidade, seu acesso às redes de telefone e internet permite que seus filhos e genros tenham um lugar onde podem resolver contatos com calma, comerem e descansarem. Ela mantém uma venda ao lado de sua residência e tem muita disposição para ajudar na postagem de mercadorias e transações bancárias, apesar das dores que sente na perna, uma condição de saúde que carrega há anos.

Chegamos à ponte com minha bagagem mais ou menos 0:30 e paguei R$150 ao taxista. Ali descemos por uma breve passagem que levava ao pequeno cais onde se estacionam os barcos. Esse ponto também é estratégico por possuir uma pequena mercearia e a casa de Piôla, seu dono. Além de alguns alimentos e outros objetos à venda (isqueiro, velas, hélices de motor de barco etc.), a casa de Piôla também serve como garagem para as motocicletas dos moradores do Crôa. Infelizmente isso não garante segurança, pois mais de uma vez a moto de Nazinho foi encontrada ali sem gasolina ou com peças quebradas. De qualquer maneira, é uma camaradagem comum entre os moradores da região e ajuda muito em termos de transporte. Há outros moradores que embarcam suas motos para atravessar o rio sempre que a usam e isso envolve um custo maior.

A canôa de Ana e Nazinho, a Flor das Águas

Entramos na canoa de Ana e Nazinho, a Flor das Águas, navegamos sob a luz da lanterna e da lua por aproximadamente 15 minutos até chegarmos à residência do casal de barqueiros. Apenas durante o dia pude ter uma noção do quão preservado estava o igarapé: uma abundante mata adjacente e pouquíssima poluição, encontrando apenas alguns raros pacotes de salgadinho vazio ou latas de cerveja nos pontos mais frequentados.

Entre os animais que vi ao longo do rio, posso citar: pássaros (japó amarelo, japó vermelho, tucanos, bem-te-vi, galinha-d’água e outros), tartarugas, inúmeros peixes que ocasionalmente pulavam da agua para se alimentar, pequenas cobras, mucura (um tipo de gambá), famílias de macacos e teias gigantes de aranha.

Ao chegar na casa, fiquei muito feliz com sua simplicidade e com a boa recepção. Assim que subimos os três degraus de madeira na frente da casa, entramos na cozinha e tomamos um açaí da região. Forte e sem açúcar, o suco dessa fruta nativa é muito apreciada junto com o “vinho” de outras frutas similares, como o buriti, patuá, abacaba e cupuaçu. Desses, apenas o cupuaçu é normalmente servido com açúcar por seu gosto azedo.

Conversamos um pouco sobre os planos dos próximos dias, pois seria a véspera de Ano Novo, e das necessidades de gastos de transporte para fazermos a viagem. Iríamos passar a virada de ano na casa da filha do casal, Camila, em Rodrigues Alves, com seu marido, filha e outros parentes. Para tanto, deveríamos levar alguns alimentos para colaborar com a ceia, então fomos para a cidade no dia seguinte provisionar algumas coisas.

Alimentação

Os alimentos cotidianos da população ribeirinha se estendem em muitas medidas para os índios shawandawa, como é comum entre os povos indígenas do Acre. Destacam-se a farinha de mandioca, o arroz, o feijão carioca, o macarrão (presente quase todos os dias), ovos, todos os tipos de carne com predominância de peixes e aves, inclusive de caça, alho, cebola, pimenta-de-cheiro e alguns temperos da horta (cebolinha, manjericão).

Banana-prata, banana-da-terra e goiaba branca são abundantes por estarem plantados no terreno e nas vizinhanças, além de alguns tipos de limão e palmeiras de região. Grande parte dos dendês e buritis que caem dessas palmeiras são aproveitados pelos animais quando as pessoas não os colhem. Apesar da macaxeira (mandioca, aipim) também estar presente na forma de raiz, era muito mais comum encontrarmos sua farinha pela facilidade de armazenamento. Um detalhe curioso é que o povo de Cruzeiro do Sul se orgulha muito de sua farinha bem seca, grossa e saborosa. A Ana costumava dizer: “essa farinha é muito melhor do que a de Rio Branco. Tem lugar no Brasil que o pessoal até pede pra gente mandar porque não encontra! E na hora de tomar um caldo faz uma falta!”

Em comunidades como o Crôa, próximas aos centros urbanos, é comum trazer legumes e verduras mais difíceis de se encontrar na região, como alface, tomate, pepino, cenoura e beterraba. Pelo menos quatro ou cinco dias da semana podíamos contar com uma bela salada em alguma das refeições. De fato, não há o costume local de se ter hortas fartas em legumes principalmente por conta das cheias sazonais que destroem as plantas domésticas.

Todo dia há três refeições principais e, ocasionalmente, uma merenda à tarde. Durante o feitio de ayahuasca, há o trabalho de cozinhar para um contingente de 15-20 pessoas de maneira regular. Para tanto, a cozinha ficava sob a tutela das mulheres enquanto os homens se ocupavam com a ayahuasca. Normalmente todos acordavam naturalmente com o nascer do sol entre 6h e 7h, e até as 8h havia pelo menos um café coado e um chá nas garrafas térmicas. Até as 9h era servido o café da manhã, que variava entre pãos caseiros, banana da terra cozida, tapioca, manteiga, mingau de aveia com leite, vitaminas e, ocasionalmente, ovos fritos. Pela abundância de árvores frutíferas no terreno, especialmente goiabeiras, bananeiras e ingazeiras, todos eram livres para “buscar” o próprio alimento a qualquer momento.

A carne é muito apreciada na região, especialmente se os animais são caçados ou criados na região. Galinhas, patos e porcos são comuns nos quintais das casas e se alimentam tanto de rações, quanto de grãos, frutas e restos de alimentos. As fazendas de gado bovino não estão próximas da comunidade do Crôa, mas seu alimento também é apreciado. Nessa viagem, o boi esteve muito presente enquanto animal de trabalho para trazer a lenha cortada do terreno. A carne de caça tem um lugar especial devido à tradição indígena e muitos já viveram dessa atividade ou possuem algum parente próximo que o faça. Carne de veado, queixada (porco do mato) e o pássaro nambu são as mais comuns, mas a variedade de bichos nessa categoria é grande, indo da cotia ao jacaré.

A pesca também é costume entre os ribeirinhos e indígenas. Sempre que navegávamos pelo rio, era possível ver redes de pesca estendidas em seu curso – as mangas. Esse método consiste em deixar uma rede de 20 a 50 metros atravessando o rio durante algumas horas (às vezes da noite pro dia ou do dia pra noite). Dependendo da estação e da sorte, a espera pode render bons quilogramas de peixe. Outro método é a “tarrafa”, onde a rede é jogada na água e afunda, capturando os peixes no caminho. A pesca com vara também compõe o cenário, geralmente feito em canoas menores a remo para evitar que o motor afaste os animais aquáticos. A variedade de peixes é tanta que não sei informar quantos tipos moram no rio e vão às mesas. Os açudes (criadouros de peixes) são mais comuns próximos à estrada, onde o acesso aos rios e igarapés é limitado.

 

Turismo de base comunitária cocriado com índios

O projeto Povo da Floresta realiza um trabalho de cocriação com as comunidades locais do Acre para fortalecer uma rede de pessoas e a consciência de atuação que deve perpassar e se traduzir em benefícios do próprio espaço físico e dos índios. Juntos com as comunidades indígenas com as quais trabalhamos na Amazônia brasileira temos uma oportunidade para aprender a história, modos de vida e características de culturas únicas com seu ambiente. Além de conhecer o próprio ambiente e sua harmonia natural, integrada a esses povos de maneira ancestral. Esse modelo não só derruba as fronteiras que a sociedade ocidental está acostumada a criar entre natureza e cultura: ele recria e fortalece seu elo.

O turismo de base comunitária que realizamos, em si, envolve dois conjuntos de atores principais: a gente que nasceu e viveu no local por gerações e, claro, os “estrangeiros”, nacionais e internacionais, convidados a adentrar esse mundo de relações. No meio desses dois conjuntos estão os mediadores formado por uma mescla de cada lado, indígenas e não-indígenas. São agentes dispostos a trabalhar na integração de diferentes pontos de vista de mundo, traduzindo e resolvendo desafios de tornarem confortáveis a experiência do contato. Esse esforço envolvido permite que preconceitos e vícios de interação sejam superados. A depredação do patrimônio natural e cultural (a floresta e seu povo), o enquadramento em papéis pré-estabelecidos e estereótipos e a exploração das etnias nativas, sem levar em conta seus desafios e necessidades materiais concretos, podem ser evitados por meio do estudo prévio e trabalho coletivo durante esse tipo de empreendimento.

Consequentemente, por meio da nossa atuação dentro da lógica do turismo de base comunitária temos:

  • Incentivos à formação de associações e cooperativas ligadas com as particularidades locais;
  • Prosperidade às comunidades envolvidas, tanto em termos materiais quanto simbólicos;
  • Adequação e criação de estruturas para abrigar e conduzir, sem prejuízos, as pessoas pelo ambiente e na convivência com as culturas;
  • Enriquecimento educacional para todos os envolvidos na experiência, com o surgimento de ideias que podem ser aperfeiçoadas com o tempo;
  • Maiores oportunidades de relações honestas e amigáveis entre cada conjunto de agentes;
  • Engrandecer a união e harmonia espiritual entre a natureza e o ser humano, tão importante nos povos indígenas. A espiritualidade da floresta é mundialmente conhecida por curar e fortalecer as pessoas que abrem seus corações a experiência da entrega, independentemente de suas religiões originais.Da mesma forma que eu tivemos a honra de vivenciar e aprender um pouco da cultura, da culinária, da medicina, dos trabalhos espirituais, trabalhos de cura, e outros costumes, propomos como o nosso projeto que outras pessoas vivenciem isso também.

Venha vivenciar esta cultura e realizar trabalhos coletivos e colaborativos para o fortalecimento e sustentabilidade de um povo que vivem em um país com nome de uma árvore, Brasil!

Qual é a função do cacique?

Cacique, segundo o Dicionário Aurélio de língua portuguesa, é o chefe indígena. A palavra é utilizada pelo não índio para se referir à autoridade de uma tribo, etnia ou comunidade indígena. Segundo antropólogos e estudiosos dos povos originários do Brasil, cada povo tem uma palavra em sua língua original para se referir a quem cuida da organização política e estrutural de sua comunidade. Por exemplo, as etnias cujo ramo familiar está ligado ao povo guarani utilizam a palavra morubixaba (ou variações dela) para se referir ao cacique. Da mesmo forma que o pajé (o farol espiritual e religioso de uma tribo) pode receber o nome de cumu ou xamã por seus grupo. A forma como cada tribo ou grupo se organiza varia de acordo com sua cultura. É possível ainda que um cacique acumule também a função de pajé, mas não se tem registros de que uma mulher tenha assumido a função do cacique.

A utilização da palavra usada pelos não índios remonta a chamada colonização portuguesa e espanhola na América do Sul, no século XV. Isso explicado, falaremos da figura do cacique, sempre lembrando que ao entrar em contato com uma tribo ou índio será provável que usará o nome correspondente em sua língua original.

Geralmente, as aldeias escolhem um cacique como seu representante perante seu grupo e nas relações com outros grupos. Em aldeias menores ele é o chefe do grupo doméstico ligado ao fundador do local, seguindo alguma tradição hierárquica. Nas aldeias maiores tem-se registro de um organização mais variada, com o uso de rodízio na indicação dos caciques, escolhidos pela população entre os chefes de grupos domésticos – que podem ocupar o posto diretamente ou indicar alguém relacionado a eles para fazê-lo. Muitas vezes, as aldeias indicam também um vice-cacique e um conselho. A predominância dessa estrutura é de homens.

“O poder do chefe, de natureza marcadamente pacífica, depende da anuência do grupo, sobretudo do apoio dos líderes de grupos domésticos. Sua habilidade política se expressa pela palavra, nos discursos e exortações na praça. As regras de sucessão ao status de líder da aldeia são flexíveis e costumam suscitar muita competição pelo cargo.”

Trecho da publicação Povos Indígenas no Brasil (Instituto Socioambiental, ISA, com dados de 2011 até 2016.

Dentro da organização dos índios, a função do cacique é de direcionar seu povo, sendo seu líder nos momentos de decisões coletivas, desacordos e brigas, mas também no cotidiano tranquilo. A palavra e ordem do cacique é a que determina para onde vai o seu povo. Em cerimônias diversas na tribo, sua presença é indispensável e tem um lugar reservado, como forma de reverência à sua função. Nos rituais religiosos, o cacique pode ter seu poder e papel de liderança dividido – ou cedido – ao pajé do grupo, devido a uma hierarquia espiritual reconhecida e desenhada pelo seu próprio povo.

Como as línguas e o comportamento dos povos são sempre vivos e mutáveis, é preciso se adaptar.
“Ultimamente, a opção de escolha de caciques tem recaído em homens mais jovens, escolarizados e que saibam se articular bem em português e fora da aldeia” (ISA, 2016).

Fontes:

Povos Indígenas no Brasil (Instituto Socioambiental, 2016)
https://pib.socioambiental.org/pt/povo/palikur/172

Dicionário Aurélio
Wikipedia, verbete cacique

Os shawãdawás

Os shawãdawas compõem um grupo originário da Terra Indígena Arara do Igarapé Humaitá, localizada no Alto Juruá, no estado brasileiro do Acre. Em 2010, segundo dados do Museu do Índio (Governo Federal do Brasil), a população era de 880 pessoas, enquanto levantamento de 2014 do Instituto Sociambiental (ISA) indica como remanescentes apenas 677 indivíduos.

Segundo o Museu do Índio (Governo Federal do Brasil), na região de Humaitá, atualmente encontram-se três comunidades e cinco aldeias da etnia, sendo elas respectivamente: Foz do Nilo, Raimundo do Vale e Novo Acordo; Santo Antônio, Paz, Bom Futuro, Matrinchã e São Luiz. No rio Val Paraíso, afluente direto do Juruá. Em decorrência do nome da sua área original, muitas vezes são chamados de arara por índios de outras etnias e não índios. Mas entre eles se autodenominam shawãdawas.

Como outros grupos indígenas do Acre, como os hunikuins e os shanenawás, os shawãdawas passaram pelas dificuldades impostas pelo período denominado de Ciclo da Borracha (1870 até 1913), passagem histórica que afetou de forma violenta e definitiva a porção acreana da Amazônia e parte da região Norte do Brasil. Nas batalhas com seringueiros e migrantes impulsionados por uma política migratória de estado, muitos desses povos originários foram explorados, aprisionados, mortos e tiveram suas vidas cerceadas pelo movimento de produção dos seringais. De acordo com dados do ISA, nos anos recentes essa etnia tem se empenhado no processo de revalorização de sua família linguística, pano. Atualmente também trabalham para fortalecer e recuperar suas tradições (com a ajuda dos mais antigos e que ainda dominam a língua).

Esse povo viveu um grande período de discriminação ao falarem sua língua materna, e por esse motivo ficaram um longo período sem transmiti-la a seus descendentes, gerando uma população infantil educada apenas em português. A consequência da interrupção do uso da língua foi o desaparecimento da terminologia de parentesco como a possível divisão social em metades, e em quatro (característica de outros grupos de língua pano). No início da década de 1990 eles começaram uma processo de resgate da língua, e passaram a trabalhar uma educação bilíngue no grupo, com o apoio Comissão Pró-Índio do Acre (CPI-Acre).

A organização social nas aldeias se dá hoje por meio das lideranças indígenas, os caciques. Hoje há três, um para cada aldeia. As aldeias remanescentes não têm mais uniformidade por família, havendo indivíduos das principais famílias nas três aldeias. Assim como a retomada da língua original, os shawãdawas trabalham por um rearranjo no parentesco do grupo com o intuito de formarem descendentes. Nesse sentido, da união de um homem de origem mesmo que longínqua desse povo com uma mulher shawanáwa resulta um descendente da etnia da mãe, um legítimo shawãdawa.

Esta etnia é, de maneira geral, monogâmica e não tem um ritual para consolidar uma união, geralmente seguindo os ritos católicos. No entanto, existem regras para que ocorra uma casamento: o homem precisa ter uma espingarda para caçar e deve plantar um roçado para sustentar a mulher. É preciso também que ele construa uma casa (enquanto a habitação não fica pronta a esposa mora na casa do pai do marido). O casamento é incentivado entre jovens casais, em uma faixa etária dos 13 ao 16 anos, o que favorece o crescimento populacional. Os papéis desempenhados seguem a forma binária (homem-mulher) que divide as tarefas por gênero.

A alimentação desse povo tem tradição na caça e agrícola, ambas funções do homem no código local, mas com a permissão de que as mulheres ajudem durante a colheita. A base da alimentação dos shawãdawas vem da mandioca, da qual também fazem a farinha. As mulheres se ocupam das atividades domésticas, cuidando da casa, dos filhos e de algumas criações, como porco e galinha. Mulheres também não participam da caça.

Os shawãdawas mais idosos são responsáveis hoje por passar as tradições desse povo às gerações. Por guardarem em si as memórias são muito respeitados. São esses guardiões que transmitem aos jovens, crianças e adultos as histórias mitológicas e os rituais, como a dança mariri (comum entre os grupos de língua pano), o sinbu (bebida sagrada ou ayahuasca) e o kampô.

Nos rituais de mariri, as pessoas mais antigas, aquelas que falam a língua fluentemente, cantam e ensinam os mais jovens. O ritual do sinbu é praticado, mas alguns índios dessa etnia não costumam mais ingerir o sinbu, mesmo tendo feito uso dele em algum momento. Em período anterior à introdução deste povo no sistema produtivo da borracha o uso do sinbu era mais recorrente, inclusive para sessões de cura, quando o pajé consumia a bebida e buscava os males no paciente para retirá-los e trazer de volta a saúde.

Segundo informações do ISA, a partir da década de 1990, alguns shawãdawas tornaram-se adeptos do Santo Daime, mas pela introdução da religião não contar com a adesão total das aldeias do grupo poucos indivíduos se consideram daimistas. Entre este povo há duas formas de usar ritualisticamente a ayahuasca: a primeira, a mais tradicional, em sessões de cura; e a segunda, por aqueles que consomem o cipó com a intenção de partilharem da doutrina do Santo Daime.

Já o ritual do kampô é utilizado para recuperar as qualidades essenciais do caçador: pontaria, visão, audição e sorte. Pegam o sapo kampô (verde e grande) e retiram dele, com um graveto, o um líquido que parece leite que fica ao longo de seu corpo. Depois, queimam dois ou três pequenos pontos circulares na pele do caçador com cigarro, ou com brasa, para introduzirem o leite sobre a queimadura. Essa aplicação gera vômitos e excreção e os índios acreditam que abrem a capacidade de ver e sentir os movimentos dentro da selva, o que facilita a caça.

 

Fontes:

Museu do Índio – http://prodoclin.museudoindio.gov.br/index.php/etnias/shawadawa/povo#HIST%C3%93RIA

PIB Socioambiental, Instituto Socioambiental (ISA)

https://pib.socioambiental.org/pt/povo/arara-shawadawa

 

Sananga, o colírio da floresta Amazônica

“Os olhos são as janelas onde tudo o que vemos e projetamos. Tudo está lá guardado, inclusive nossa história. O espírito do sananga faz a cura expulsando todos os males da alma e da matéria.” Essa é a explicação do objetivo da sananga relatada por Tuin Huã Kaxinawá, pajé da aldeia do Caucho do alto do rio Murú,

O espírito da sananga ou shanovo (espírito da floresta) tem como processo medicinal o refinamento da visão espiritual. Assim, a sananga possibilita enxergarmos a verdade que se encontra a nossa volta sem a nossa cegueira pessoal e limitante, permitindo visualizar e deslumbrar a beleza que existe à nossa volta.

É possível uma relação indireta e de auxílio da sananga em algumas doenças psicossomáticas, já que os olhos são nossas janelas para a percepção deste mundo. Enxergar o nosso inimigo com os olhos colabora em nossa luta diária. Assim, esta medicina natural auxilia na percepção do que ocorre em nossa volta, trazendo harmonia e consequente realização espiritual, emocional e física.

A tradição do uso da sananga pelos índios kaxinawás é de pingar uma ou duas gotas em cada olho antes de irem para a caça. Eles acreditam que a substância aguça a percepção facilitando os movimentos sutis da densa floresta, conseguindo assim, distinguir a sua caça. Além de ressaltar texturas visuais, profundidade, cores o que, dizem os índios, auxilia o instinto caçador em sua busca visual da presa dentro da floresta.

O colírio da sananga é obtido por meio da extração de um sumo de planta brejeira em forma de arbusto, chamada Tabernaemontana Sananho. Um dos princípios ativos encontrados é a Ibogaína. Para preparar o colírio são batidas as raízes do arbusto com água limpa e potável, que resultam na extração do princípio ativo da planta.

A Ibogaína provoca uma experiência psicoativa o que pode levar algumas pessoas a transes e/ou rápidas visões, chamadas de mirações por algumas tradições ayahuasqueiras. Após a aplicação, ocorre uma ardência que dura no máximo três minutos, dependendo do estado clínico do paciente e a frequência com que o indivíduo faz uso do colírio. A experiência da sananga é relatada como um momento muito especial. Após a ardência surge uma sensação de completude. É como se o indivíduo estivesse totalmente inserido em um momento atemporal, onde nada mais importa.

Algumas tribos das etnias nawas, utilizam-se da sananga para retirar a chamada panea. Panea é representada por uma forma de energia negativa acumulada que carregamos, normalmente associada ao suco gástrico do estômago, que levam ao acúmulo de todo o tipo de bactérias e doenças. Este acúmulo é originado pela ingestão de carne (que leva à putrefação no aparelho digestório e excretor), de medicamentos e de substâncias tóxicas dos alimentos que não são naturais como os da floresta. A panea pode destruir nossa resistência e saúde.

Espiritualmente e energeticamente, a sananga ajuda a limpar o canal ocular e contribui para a fluidez da percepção no chakra ajna (terceiro olho, ou visão interior). Ou seja, aumenta a percepção e visão espiritual e sensitiva. Em pessoas com sensibilidade mediúnica desenvolvida há a comprovação de expansão do campo áureo. A Ibogaína auxilia ainda no tratamento de dores crônicas e é conhecido como um forte estimulante afrodisíaco, além de facilitar processos meditativos e de introspecção.

Não se recomenda a prática do uso da sananga fora da floresta, local onde a aplicação é realizada de forma adequada durante um trabalho e ambiente apropriado voltado à evolução espiritual e, principalmente, com a orientação de um xamã.

Deve-se considerar que o organismo indígena é mais delicado e possui uma pureza de alimentação, ambiente e qualidade de vida não encontrada no ambiente dos não índios, sendo aconselhada a retirada da panea por meio de sananga pelo povo indígena.

Estudo científicos demonstram possível eficiência na aplicação da sananga, em especial nas doenças bacterianas existentes no globo ocular. Sua aplicação auxilia no tratamento ou prevenção de conjuntivite, terçol, irritações nos olhos, catarata, miopia, hipermetropia, astigmatismo, ambliopia, olho seco, fotofobia, glaucoma, catarata, ceratocone, dores de cabeça, catarro derivante de sinusite e renite. “Nossa visão fica mais precisa, clara e nítida após a aplicação”, afirma o pajé. Apesar de sua contribuição, a sananga não promove a cura de problema físicos existente nos olhos. Importante: é contraindicado seu uso após cirurgias oculares ou em caso de ferimentos ocorridos.


Fontes:

BRAMATTI, J.P.C. (2016) Percepção, alucinação e perspectivas: um jogo de luzes e sombras. Disponível em http://bdm.unb.br/handle/10483/10976

LOPES, B.P.C.S (2017) Estudo etnobotânico de plantas medicinais na Terra Indígena Kaxinawá de Nova Olinda, município de Feijó, Acre Disponível em http://hdl.handle.net/11449/150997>

Blog Xamanismo Universal – Disponível em http://xamanismouniversal.blogspot.com.br/2011/09/sananga-uma-nova-cura-para-os-olhos.html

Blog Alquimia das Árvores – Disponível em http://alquimiadasarvores.blogspot.com.br/